Pensar nas ondas quentes das brasas sem lembrar a espuma fresca da cerveja é quase uma heresia. Mas este dueto clássico dos churrascos deve estar bem afinado para se tirar o melhor partido da carne, peixe ou vegetais. Vamos então pôr a tocar os estilos de cerveja que encaixam melhor neste ritmo.

Não há forma mais antiga de cozinhar do que usando o calor das brasas nos alimentos. É preciso recuar mais de um milhão de anos para chegar ao momento em que o homem aprendeu a controlar o fogo. Nessa revolução cultural, o fogo tornou-se a mesa, o lugar em volta do qual se convivia e se passava tempo confortável e iluminado. Pode passar outro milhão de anos que o fogo e a comida nunca deixarão de juntar pessoas. 

Neste artigo, sugerimos-te três formas de refrescar o ambiente do churrasco com as cervejas certas para cada ocasião. Tem atenção, ainda, ao tipo de copo a usar: no detalhe é que está o ganho. Estejam as grelhas apetrechadas com carne, peixe ou vegetais, há sempre uma boa companhia.

Quem nunca foi assolado por esta dúvida que atire a primeira pedra: quais são as melhores carnes para churrasco? Neste tipo de questões, a tradição é capaz de ter as melhores respostas. Avancemos, então, para uma das carnes que mais deu provas de alta performance na grelha: a picanha.

Rainha no santuário mundial do churrasco que é o Brasil, a picanha é um tipo de corte da zona lombar do bovino, da peça de alcatra. Na compra, a escolha deve assentar sobre uma carne marmoreada e com uma boa gordura de superfície. A fatia ideal, dizem os especialistas, deve ter 4 a 5 centímetros antes de ir para a grelha. E embora os gostos não se discutam, recomenda-se saboreá-la mal passada, para poder usufruir da sua forma suculenta.

Principais ingredientes: Picanha e flor de sal (q.b.).

Como grelhar: Deves cozinhar a picanha em duas fases. Primeiro, coloca as fatias de 4 a 5 centímetros na grelha, sem sal, com uma brasa forte, a 30 cm do fogo, por 3 a 4 minutos de cada lado. Depois, corta cada fatia em duas, tempera com sal e volta a colocar na grelha: 3 a 4 minutos de cada lado.

As Indian Pale Ale (IPA) destacam-se pelo sabor refrescante com notas persistentes. São cervejas que não se deixam intimidar por uma picanha e cujo amargor moderado a intenso ajuda a equilibrar a presença forte e salgada da carne. Ao mesmo tempo, o médio a alto teor alcoólico ajuda a equilibrar a gordura densa.

É um jogo de equilíbrios, quase uma competição entre o prazer da carne e o da cerveja. O amargor moderado a intenso da IPA complementa a personalidade vincada da picanha. À gordura da carne a IPA responde com o seu alto teor de álcool e os lúpulos florais acordam as papilas para mais um pouco de picanha.

Afirmam os especialistas da gastronomia que, embora os santos populares sejam de junho, não há melhor altura do ano para comer sardinhas do que em agosto. A informação está dada. Agora, resta tentar equilibrá-la com a vontade. Puxemos, então, a brasa à sardinha.

Figura central da mesa portuguesa, ela entra na grelha sem pedir licença para pingar. É por isso que as brasas fazem dela a melhor: porque lhe tiram o excesso de gordura (e em agosto, elas ainda vêm mais gordinhas). Na compra, evita as sardinhas muito grandes, escolhe escamas firmes, corpo rijo, pele lisa, olhos límpidos e guelras avermelhadas. Para potenciares ainda mais este peixe sacrossanto, combina-o com uma cerveja à altura.

Principais ingredientes: Sardinhas inteiras e sal grosso.

Como grelhar: Certifica-te de que as brasas estão prontas: pelo menos 30 minutos de fogo são necessários para atingir o calor perfeito e completamente sem chamas. Salga a sardinha (o sal deve ser colocado nas guelras) 20 minutos antes de ir para a grelha. Deixa a sardinha assar durante não mais do que cinco minutos, para ela ficar no ponto. Se, ao cair, a gordura resultar em chama, afasta a grelha para não correres o risco de a pele do peixe queimar.

O baixo teor alcoólico da German Pilsner permite equilibrar a quantidade de sardinhas com a quantidade de cervejas consumidas. Ao palato, esta cerveja mostra o carácter rico do malte e deixa que o lúpulo solte o seu amargor, que perdura no fim de boca. Traz ainda notas herbais ou florais e um corpo leve.

O toque herbal ou floral da German Pilsner é a única qualidade que contrasta com a gordura marcada da sardinha, tornando, por isso mesmo, esta combinação especial. De resto, é a paz entre as espécies. O amargor do lúpulo entra no mesmo comprimento de onda do do peixe e o corpo leve da cerveja combina na perfeição com o da sardinha.

A forma como o fogo exponencia os sabores de alguns vegetais é surpreendente. Esta obra da química é particularmente memorável em peças como o pimento, a beringela, a courgette, a cebola, a batata-doce e o tomate, que tomam novas personalidades assim que entram na grelha. Experimenta assar tomate-de-rama maduro (inteiro), courgette, pimento e beringela em fatias longitudinais com umas pedras de sal e orégãos, cebolas rachadas em quatro pinceladas com azeite e mel e batata-doce simples, às rodelas. Em alternativa, uma espetada de courgette, tomate, cebola e batata-doce pode fazer as delícias de um churrasco. Resta saber qual o estilo de cerveja que mais se adequa a esta palete de cores.

Principais ingredientes: Pimento, beringela, courgette, cebola, batata-doce e tomate.

O ligeiro aroma frutado das britânicas Golden Ale faz logo abrir o apetite, dando um bom prenúncio ao churrasco. Na boca, são cervejas com um amargor equilibrado, um pronunciado sabor a lúpulo, surpreendentes e refrescantes notas cítricas e um final seco.

Os legumes, quando expostos ao calor, devolvem-nos quase sempre um sabor adocicado. É nele que vai embater o amargor da Golden Ale. As notas cítricas, por outro lado, vão refrescar a sensação de fumado dada pelo churrasco e o seu sabor bem presente vai destacar-se face à delicadeza dos legumes.